Hoje já não existe mais ruas vazias, a não ser nos modernos condomínios bem afastados das cidades.
Noutros tempos, eram tantas as ruas desertas que produziam um eco —o eco das ruas vazias.
Palcos perfeitos para despertar o imponderável de situações irreais.
Quantas histórias de terror ouvi das babás nas noites depois do jantar!
O pavor daquelas narrativas ainda carrego na memória.
Uma das brincadeiras das crianças do meu tempo era gritar em uma rua vazia e esperar pelo eco.
Todos ouviam o eco, e logo surgia o comentário: seriam respostas de almas do outro mundo?
Como era fértil a imaginação das crianças de outrora!
Não sei se as de hoje ainda acreditam em almas do além a provocar o eco das ruas vazias.
Hoje temem os bandidos e agentes do mal, chorando e agarrando-se às saias das mães — quando não evitam por completo esses lugares.
Na infância eu costumava brincar no Beco Alto, na Prainha, gritando em voz alta e aguardando a resposta: o eco.
Hoje reparo que o Beco Alto está todo habitado e não é tão alto assim que pudesse ser considerado uma rua vazia.
A Prainha, por sua vez, foi transformada em avenida para escoar o trânsito.
E assim as ilusões da infância vão desaparecendo, restando apenas as histórias para serem contadas.
Os colegas mais velhos nos ensinavam que, a certa distância de um muro, ou mesmo dentro de um cinema, o eco surgia com intensidade — sem necessidade de ruas vazias.
Gosto de ouvir histórias. E porquê não também contá-las?
Dia desses, assisti pela televisão à lembrança de um fato histórico importante, acontecido há sessenta anos.
Os presentes e oradores, em um pequeno auditório, se consideravam heróis, ouvindo o eco da glória.
Os ausentes, verdadeiros heróis de fato, ‘en passant’ foram lembrados no eco das palavras.
E a vida continua assim.
Gabriel Novis Neves
23-09-2025
Largo do 'Beco Alto' |
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