quinta-feira, 16 de setembro de 2021

TEMPOS DE ESTUDANTE EM CUIABÁ


Foram compreendidos de março de 1942 até março de 1953 meus bons tempos de estudante em Cuiabá!  Nas vezes que tento rememorar aqueles tempos, percebo estarem tão frágeis as lembranças em minha memória, que chego mesmo a duvidar de que eles tenham existido.


Deveria valorizá-los mais e talvez ter aproveitado com maior intensidade todos os seus minutos e segundos, pois, foram épocas maravilhosas das descobertas dos valores da vida.


Demarcou esse episódio o fato de ter sido  matriculado para estudar na Escola Modelo Barão de Melgaço, anos da troca da moeda réis para cruzeiros. Outras trocas de moedas (foram tantas), que vagamente sem saber o ano, sei que o antigo réis, passou pelo cruzeiro, cruzeiro novo, cruzado e real foi o que ficou na minha memória e nem sei se a ordem de mudanças foi esta, ou se faltou alguma.


Sei também que até 1953 não tínhamos a inflação que temos hoje, pois nos anos de mesadas, nunca foram corrigidas. Não sei o que pensava quando na Escola Primária, a não ser estudar para passar de ano.


Os 5 anos que estudei no Colégio Salesiano me lembro bem das missas que assistíamos antes das aulas, das confissões com o velho padre barbudo Agostinho, cara a cara, com as missas de domingo, com o recebimento da Sagrada Eucaristia.


À tarde curtia jogos de futebol do campeonato carioca, na velha e obsoleta eletrola-rádio do bar, que fora transferida para minha casa, atendendo a um desejo meu. Ondas curtas, com muitos ruídos e cortes de luz muito frequente à época. Após o jogo para mim o domingo estava acabando e era hora de rever as tarefas escolares para segunda-feira.


Naquela ocasião, meus colegas, cujos pais possuíam cursos superiores, despertaram seus filhos para prosseguir os estudos de segundo grau geralmente no Rio de Janeiro. A população considerava prioritariamente 3 cursos superiores – Direito, Medicina e Engenharia Civil, com opções para as carreiras militares no Exército, Marinha e Aeronáutica.


Nas comemorações da conclusão do curso, na foto tirada após a missa, tínhamos três colegas com ternos azuis-marinho e o restante com ternos brancos, respeitando o calor de Cuiabá. Os de azul-marinho já tinham decidido ir para a marinha brasileira; eram Carlos Eduardo Epaminondas, Benedito Canavarros e Édson Borges. Mas os três foram reprovados nos testes da Marinha, sendo que dois deles seguiram a Medicina e outro Engenharia Civil.


Eles, os que vestiram azul-marinho, partiram depois para o Rio de Janeiro; eu ainda fiz dois anos do segundo grau no Colégio Estadual para procurar o Rio, lá concluindo o segundo grau e cursando seis anos de medicina.


Realmente são poucas as recordações desse belo período da nossa infância e adolescência, sendo fortes as minhas recordações como mirim-trabalhador e garçom-mirim do bar do Bugre, que são tema de outras crônicas já publicadas. Fico devendo as lembranças de meus anos de estudante no Rio e Janeiro.


Gabriel Novis Neves

15-09-2021






quarta-feira, 15 de setembro de 2021

AMIGOS DE INFÂNCIA


Procuro ao meu redor meus amigos de infância,  e não os encontro. Amigos da escola primária, aulas de catecismo na Catedral, jogos de botão sobre as calçadas, peladas na rua, brincadeiras no quintal. 


Onde estarão? Será que partiram silenciosamente neste longo trajeto que é a vida humana e que um dia acaba? É incrível como não encontro nenhum deles para um papo, mesmo que seja pelo telefone fixo! 


Até os contemporâneos estão rareando, só me lembrando de um de 91 anos que, às vezes,  conversamos pelo telefone, impedidos que somos pela pandemia de um encontro presencial. Com mais de 86 anos tenho colegas de magistério e conhecidos, longe da amizade raiz. 


Outros amigos, o distanciamento natural da vida nos afastaram. Até os amigos dos tempos da faculdade estão rareando, impedindo aquelas habituais reuniões realizadas uma vez por ano onde tínhamos muitas vezes de pedir auxilio para identificar este ou aquele colega, vítima do tempo que vai “moldando”, inclusive, nossas fisionomias.


Conquistei no decorrer da vida novas amizades,  sem o gosto da ingenuidade infantil, porém amigos de sempre. Os “amigos do tempo”, como os da infância, são generosos, respeitosos e muitas das vezes nos ajudam nas dificuldades do nosso dia-a dia.


Tenho muitos amigos queridos dessa fase adulta, a quem demonstro afetividade recíproca. Temos conversas de “amigos do tempo”, em que nossos diálogos talvez nos aproximam mais do que dos meus próprios amigos da infância.


Meus filhos e netos têm seus amigos, mas a amizade é de outra sintonia. Tenho muito a escrever sobre esse assunto,  e peço ao Criador paciência e me espere por mais 100 anos.


Gabriel Novis Neves

10-09-2021




terça-feira, 14 de setembro de 2021

PASSADO


Quem tem rico passado muita coisa tem o que escrever no seu crepúsculo, quando livre das obrigações do trabalho formal, resta-lhe tempo para devaneios.


Não faço nenhum esforço para recordar fatos e dados acontecidos desde meus cinco anos de idade. O meu superego faz uma triagem daquilo que devo publicar. Quanta coisa curiosa e importante da nossa história deixo de publicar para não “ferir” vaidades!


Preocupo-me quando escrevo com os personagens envolvidos e certos assuntos são proibitivos,  como os políticos desde 1964. Não é bom escrever sabendo que irá magoar pessoas, sendo que nesse período de atividade política partidária de 57 anos muitos protagonistas não se encontram mais entre nós e seus descendentes são nossos queridos amigos.


A divisão do Estado, a história da UFMT, a experiência de ter sido secretario de Estado no Estado não dividido e dividido, são alguns pontos que abordei de maneira muito superficial nestes quase 15 anos que escrevo e publico estas pequenas crônicas, meus "textículos".


Possuo um arquivo de material impresso e fotográfico desses anos em que ocupei cargos públicos os mais diferenciados e importantes no nosso Estado. Já pensei em doar esse rico patrimônio ao historiador Fernando Tadeu, para ele usufruir dos textos para a nossa história como registro escrito. 



Como o “problema do trem” está resolvido, Fernando Tadeu esquecerá a longa espera do seu trem da Mangueira e cuidará da história, principalmente da UFMT, até então pouco investigada e compreendida.


O passado explica a nossa própria vida e todos nós construímos um, alguns contados, outros não.


Gabriel Novis Neves

05-09-2021




segunda-feira, 13 de setembro de 2021

TEMPOS DE POLÍTICA


Em períodos de política, as mesas do Bar do Bugre ficavam divididas entre aqueles que apoiavam o governo daqueles que eram opositores. 


Naquela época não era usado ainda o termo empresário para os comerciantes como é hoje. 


Em casa, meu pai dizia que o governo nunca perdia eleição, tinha suas preferências entre os conservadores, mas no bar era “irritantemente” neutro! 


Certa ocasião perguntei-lhe o porquê dessa sua postura, e ele me respondeu que, como homem de negócios, embora restrito ao comércio varejista, não podia explicitar suas preferências políticas para não perder sua imensa freguesia. Ele tinha toda razão, e no seu enorme bar o pessoal encontrava frequentadores dos mais diversos matizes políticos.


As discussões políticas existam entre os fregueses, chegando muitas vezes a elevar o tom das discussões, nunca, porém às vias de fato. Meu pai contava como troféu que, em meio século como dono de bar, nunca ninguém tinha atirado dentro do seu estabelecimento, fato normal em outros bares da época, hábito esse que permanece até hoje.


Para reforçar o que digo,  as redes sociais de hoje relatam tiroteio num bar de Cuiabá por motivos políticos.


Naquela época era comum no fundo do principal salão do bar, próximo à enorme eletrola, colocar a foto oficial do Presidente da República. Quando da queda da ditadura Vargas na noite de 29 de outubro de 1945, no dia seguinte, antes da abertura do bar, papai já havia retirado da parede a foto do ditador e guardado em seu “fantástico” escritório nos fundos do bar.


Quando,  às 10 horas da manhã, jovens bacharéis em direito recém-formados no Rio de Janeiro, comandados por José Feliciano de Figueiredo, entraram no bar para quebrar o quadro com a foto do Getúlio nada encontraram, logo saíram e foram quebrando dos outros bares e cafeterias das redondezas.


Meu pai sempre foi um moderador, não usava armas e não brigava com ninguém. Seu bar foi reconhecido como “campo neutro” para manifestações políticas.


Quando, 5 anos depois, Getúlio Vargas ganhou as eleições do Brigadeiro Eduardo Gomes para Presidente da República, papai retirou o antigo quadro com a foto da Getúlio do mofado escritório e o pregou na mesma parede do salão do bar, e “inocentemente” colocou na velha eletrola, a marchinha carnavalesca cantada por Chico Alves, - “Bota o retrato do velho" outra vez...


Assim era o cenário político de antigamente no Bar do Bugre!


Gabriel Novis Neves 

10-09-2021




sábado, 11 de setembro de 2021

NAMOROS, NAMORICOS, CASAMENTOS


Pulei da cama às 04.10h da manhã pensando na diversidade de atrações que era o Bar do Bugre. Algumas foram atrações fataisMuitos aspectos já foram tratados aqui no blog, outros permanecem na minha memória. 


Além de ser um bar-sorveteria, era um grande Centro de Vivência nos cinquenta anos de sua existência. Todos  os acontecimentos importantes, políticos, econômicos e sociais, necessariamente passavam por lá, funcionando também como Centro Histórico da capital do Estado.


Gostaria de abordar o Bar do Bugre como sede de “namoricos” que começavam pelas suas calçadas, sendo o próprio Bugre presa fácil dessa conquista.


Uma linda moça, 20 anos mais nova que o Bugre (Olyntho) costumava passear com as amigas pelas calçadas da praça Alencastro, onde se localizava o casarão que abrigava a sede do Bar do Bugre (Bar Moderno só nos registros comerciais). Os olhares se cruzavam com os dele e a amarração que parecia difícil para aquele solteirão, desapareceu ante o encanto daquela jovem. 


O Bugre apaixonado pediu licença ao pai da linda donzela para namorá-la e em pouco tempo estavam casados de “papel passado”, em Cartório da Capital.


Vieram os nove filhos e o Bugre da porta do bar viu o desfecho de outros casos amorosos como o seu acontecerem.


Gostava de ouvir a narração do meu pai e da minha mãe sobre o caso de amor entre eles. Ela dizia que passeava com amigas pelas calçadas da praça Alencastro para ouvir as músicas que vinham pela possante eletrola de dentro do bar, quando, nesse vai e vem, ele a conquistara. Ele jurava que havia sido seduzido pelo passar insistente da linda moça pelas calçadas do bar com seus provocantes olhares.


O Bar do Bugre ajudou também a aumentar a população de Cuiabá, além de ser um fator de energização de amores represados.


Gabriel Novis Neves

10-09-2021


40 × 20 anos de idade 
OLYNTHO NEVES e IRENE NOVIS


SAINDO DOS ARMÁRIOS


Bastou um chuvisco esta madrugada para que os agasalhos saíssem dos armários e guarda-roupas das casas cuiabanas.  Neste momento que escrevo a temperatura é de 27 graus, com leve brisa em céu encoberto. 


Para quem vinha com 40, 41, 42, 43, 44 graus,  estamos em pleno “invernico” ou “friagem” , como diz o cuiabano. E como aproveitamos esses raros momentos! 


Depois do almoço, sem o auxilio do ar refrigerado, “puxei” gostosa soneca e depois voltei com disposição ao computador, sem ligar o ar refrigerado do escritório; sinal de comemoração entre nós.


Pela janela descobri algumas poucas pessoas caminhando pela rua, vestidas com os seus agasalhos.


Lembrei-me muito do meu mestre, professor Cesário Neto. Durante os dois primeiros anos que foi meu professor de português no Colégio Estadual de Mato Grosso, nunca deixou de comparecer às aulas de terno, gravata, suéter, chapéu e guarda-chuva. Dizia sempre aos seus alunos que um homem prevenido vale por dois.  Acreditava que foi pelos seus hábitos de vestimenta que nunca pegou uma pneumonia.


Leve brisa inacreditável me estimula a escrever sobre Cuiabá e seus hábitos. O sol está encoberto e logo mais teremos o crepúsculo com a escuridão. Como gostaria que todos os dias fossem iguais a hoje, com chuvisco, temperatura amena o dia todo,  sem o sol escaldante, encoberto e leve brisa agradável! 


“Cuiabrasa” está tão diferente hoje que seus filhos torcem para que a meteorologia não falhe, pois só assim teremos amanhã outro dia humano. 


Enquanto isso vamos aproveitar ao máximo este dia para vivermos a ilusão da não pandemia, onde poderíamos sair para namorar, lanchar chocolate quente com bolo de arroz, jantar fondue de queijo e canjiquinha de sobremesa.


Vamos sonhar enquanto isso não for proibido, e os agasalhos não voltem aos armários. Já penso no sono bom, com madrugada de chuvisco.


Gabriel Novis Neves

09-09-2021




sexta-feira, 10 de setembro de 2021

CHUVA EM CUIABÁ


Após mais de três meses de terrível seca, calor sufocante e baixa umidade do ar, fomos agraciados com a tão esperada chuva pela madrugada! Ainda não foi aquela chuva barulhenta, com ventos derrubando árvores, destelhando casas antigas, entupindo “bocas de lobo”, interrompendo o trânsito, tão comum nesta época do ano!


Os passarinhos acordaram “cantando” mais alto numa alegria sem fim, as folhas mais verdes nas árvores, a população respirando melhor e em casa o ar refrigerado desligado.


Chamo essa chuva, de chuva da manga, outros de chuva do caju, o certo, porém, é que em breve teremos essas frutas e um verde mais verde nas árvores. As mangueiras, a partir da primeira chuva começam a ficar amareladas, com o amadurecimento dos seus frutos esperando a segunda chuva para forrar os seus pés da deliciosa fruta. 


Temos vários tipos de manga, e aprecio todas, confesso, no entanto, que a minha predileta é a Burbom. Aprecio também a manga Rosa, Espada e a Comum.


Os pés de caju, com as chuvas, ficam arqueados chegando a encostar seus galhos férteis no solo, para a alegria dos artesãs que transformam o caju em potes de caju em caldas, caju seco, rapadura de caju, suco de caju ou simplesmente saborear a fruta retirando-a do galho.


A chuva é gostosa sempre, porém, romântica quando em casa de adobo e telhado de telha de barro, sem forro, pois propicia o maravilhoso respingo o com seu toque na pele, especialmente no quarto enquanto dormimos, contato esse que tão bem nos faz a alma! Tive na minha infância a felicidade de ser “borrifado” pelas chuvas, privilégio extinto com a minha ida ao Rio para estudar. 


Quando voltei, a minha casinha tinha forro,  e depois sucumbi em quartos de cobertura de concreto onde não se ouvia nem o cair da chuva, muito menos o seu borrifo.


Não sei como os meus bisnetos reagiriam a um borrifamento nos seus corpos, das chuvas da manga. É a evolução ao mundo moderno, onde nos é negado a maioria dos prazeres da natureza!


Vamos aguardar outras chuvas como essa da madrugada de hoje, com seus incríveis benefícios para o meio ambiente e nossa sensibilidade!


Gabriel Novis Neves

09-09-2021