terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

TRÁGICAS RECORDAÇÕES DE UM MÉDICO


Em 1966 eu era diretor do Hospital Colônia de Alienados do Coxipó da Ponte.


Morava na casinha da rua Marechal Floriano Peixoto, com mulher gestante do seu 3º filho.  O telefone tocou na hora do almoço, momentos depois que tinha deixado o hospital.


Era o administrador, pedindo que eu comparecesse com urgência ao hospital, pois uma menor que estava internada na enfermaria sangrava muito, tendo molhado de sangue o lençol branco que a cobria.


Imediatamente me dirigi ao hospital, pensando em estupro, pois havia nessa ocasião promiscuidade entre internados e alguns funcionários.  


Como ginecologista, não teria dificuldades de chegar a uma conclusão diagnóstica.


Pela anamnese nada ficou esclarecido, pois todas as perguntas feitas por mim, tendo ao meu lado uma auxiliar de enfermagem, ela respondia de maneira monossilábica e incompreensível.


Pelo exame físico constatei que a menor, com uma fina agulha de costura com fio de linha, havia costurado os pequenos lábios da sua virgem vagina.


Desfiz a sutura, fiz-lhe um curativo compressivo com gaze esterilizada e a devolvi à enfermaria.


Pedi mais atenção do pessoal da enfermagem para que atos como aquele não mais se repetissem.


Será que a menor havia presenciado atos sexuais e tivesse feito a costura para se proteger?


Após meses de internação a família veio pega-la, fisicamente sem alterações na sua anatomia ginecológica, para continuar o tratamento psiquiátrico em casa.


Quando no hospital dos alienados, eu tive oportunidade de realizar alguns partos das suas internadas nos seus próprios leitos. Outras, quando em trabalho de parto, levava para a Maternidade do Hospital Geral na rua 13 de junho.


Com auxílio da assistente social, conseguimos fazer a doação de algumas dessas crianças, que então eram criadas pelas mães no hospital de alienados.


Os resultados não foram dos melhores, naquela que acompanhei como padrinho da criança.


Apesar de todo o carinho da família que a adotara, sua vida adulta foi uma tragédia, tornando-se uma pessoa perigosa, morrendo de causa natural ainda jovem.


Gabriel Novis Neves

04-02-2022







Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.