sábado, 19 de fevereiro de 2022

CÂNTICO DOS PÁSSAROS


Este foi o motivo do meu conhecimento com o Pedro Paulo Lomba.


Carioca, tinha tido uma experiência administrativa na UFRJ.


Desempregado morando com a mãe no Rio de Janeiro, tinha contatos com os padres da Missão Anchieta no Utiariti.


Combinou que iria passar uns dias com eles, pois pretendia escrever um livro sobre o cantar dos pássaros amazônicos e depois produzir um documentário.


Sempre com dinheiro curto, pois não dava o mínimo valor ao mesmo, como constatei anos depois de convivência.


Chegando de ônibus e a pé  na casa dos jesuítas, mochila nas costas, ficou o tempo necessário para realizar o seu trabalho de gravar o cântico dos pássaros.


Pediu dinheiro aos padres para pagar a sua passagem até a rodoviária de Cuiabá.


Como não tinha dinheiro para continuar a viagem de regresso para sua casa, pediu aos padres que indicasse alguém para socorrê-lo.


Os jesuítas conheciam profundamente o diretor do Museu Rondon da UFMT, e lhe forneceram uma carta de recomendação e número do telefone do professor Vieira.


Na rodoviária, sem um único tostão no bolso, conseguiu ligar para o professor para que viesse busca-lo.


Perspicaz, o Vieira logo viu que estava com um brilhante às mãos, e levou-o para sua chácara que ficava as margens do Coxipó, onde lhe hospedou.


Conversaram durante dois dias sem parar sobre tudo.


Fui então procurado pelo professor diretor do Museu Rondon, na Reitoria.


Cientificou-me do ocorrido e disse que eu não poderia deixar de conversar com o Pedro Paulo Lomba.


Marcou para aquele dia à noite uma reunião às 20 h na sua casa.


Chegando lá, encontrei um jovem barbudo, cabelos caindo aos ombros, usando óculos redondos, calça e blusa caqui verde, e botas. Fumava cachimbo.


Era o próprio Che Guevara.


Começamos a conversa com mais uns professores “avançados” da UFMT até alta madrugada.


Perguntei se poderia ficar mais uns dias para aprofundarmos nas nossas conversas.


O ano era 1972.


Ele concordou.


Deixou Cuiabá com contrato assinado como técnico da UFMT, por não possuir diploma de nível superior para ser “professor auxiliar de ensino” e “professor colaborador” ganhava muito pouco, não dando para seu sustento.


Retornou ao Rio de Janeiro para voltar em definitivo para Cuiabá, com seus poucos pertences.


Durante o meu período como reitor foi um colaborador exemplar.


Hoje não podemos falar da UFMT sem o citar.


Trabalhou na elaboração do texto “universidade da selva”, lançado em Brasília na reunião do 1º Encontro de Reitores das Universidades Publicas do Brasil, em 17 de agosto de 1972.


Trabalhou no projeto e execução do museu Rondon, com a oca e casa da flauta ao lado do parque aquático do campus de Cuiabá e do Projeto Aripuanã que viabilizou a UFMT.


Em reunião no IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) em Brasília para aprovação do Projeto Aripuanã, com a presidência de Maurício Rangel Reis, seus técnicos, eu e o Lomba.


Em meio à discussão acalorada, um jovem PhD recém-chegado dos EUA, vendo o vasto conhecimento do Lomba, indagou qual a sua formação?


Este respondeu sem pensar: “Teoria do Conhecimento”.


Estava encerrada a discussão e o Projeto Aripuanã aprovado.


Gabriel Novis Neves

28-01-2022






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