quinta-feira, 11 de janeiro de 2024

TEMPOS DE CRIANÇA


Ao abrir a janela do meu dormitório — vigésimo andar do prédio onde resido — para iniciar mais um dia de trabalho, não tive como deixar de lembrar dos meus inesquecíveis pais.


Uma forte ‘corrente de ar’ me envolveu, obrigando-me a fechar o vidro da janela.


A cuidadora que foi molhar as plantas do jardim da cobertura, me enviou fotos com vasos de plantas ao chão, arrastados pelos fortes ventos.


Meus pais tinham verdadeiro pavor de ‘corrente de ar’, principalmente do fatídico ‘vento nas costas’.


No dizer deles, causava ‘pneumonia’, doença temida à época.


Quando eu nasci — corria o ano de 1935 —, ainda não havia sido utilizada ‘a penicilina’. Segundo uma marchinha carnavalesca de então, curava até defunto.


Também a pneumonia, causada pelo ‘golpe de ar’, era confundida com a ‘tuberculose pulmonar’. Esta matava! E como!


O único remédio que existia naqueles tempos para tratamento da tuberculose era o clima serrano de Chapada dos Guimarães.


A pneumonia era tratada doutra forma: o paciente “era bem-agasalhado, ficando isolado em seu dormitório. Tomava chá de raízes e ervas medicinais.


Quando muito era oferecido meio copo de água natural, misturada com o pó de um envelope de ‘salofeno’, que compravam na farmácia do Seu Campos.


Raízes e ervas eram adquiridas no armazém do Tingo, na Prainha, próximo à minha casa na rua de Baixo.


Com a chegada dos antibióticos e vacinas, o ‘golpe de ar’ virou somente tradição, cultuada pelos mais antigos.


Meus pais tinham pavor de ver suas crianças sem camisa em dias de ventania. O castigo vinha ‘a galope’: o chinelo chispava em nossas costas.


Fui criado às voltas com outros traumas da infância, como o de ‘nadar nas águas do rio Cuiabá’.


Meu pai contava a história do ‘redemoinho na boca do vale’. Era um poço muito perigoso. Quem ‘caía nele’ se via ‘sugado’ para suas profundezas, morrendo por asfixia, com os pulmões inundados de água.


Tão a sério levei a advertência de meu pai, que não aprendi a nadar. Meu cérebro ficou impregnado desse medo. Tanto que me limitou definitivamente de fazer uso desse divertimento. Deixei de explorar as delícias da natureza, nadando, remando, praticando canoagem.


Fiquei complexado em razão da crueldade da ‘boca do vale’, vitimando muitos jovens.


A tempestade do amanhecer de meus dias acabou passando, para minha tranquilidade. Mas deixou um caminhão de doces recordações!


Gabriel Novis Neves

3-12-2023






Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.