Leio e ouço, até com certa frequência — sobre pessoas, com bom nível de educação —, a afirmação de que não se arrependem de nada que fizeram no curso da vida.
E mais: fosse dada a eles a oportunidade de recomeçar, fariam tudo por igual. Chego a me perguntar: não serão palavras, apenas palavras?
Muito próprio deles, jamais admitem erro, o que nos revela — a tudo assistindo de camarote — que há aí uma pontinha de ‘orgulho’.
Se a mim me fosse dirigida tal pergunta, hoje diria que não me abalançaria a tomar decisões de ‘alto risco profissional’, mesmo com a possibilidade de acerto batendo no teto.
No âmbito familiar — vezes tantas ‘priorizei o trabalho’. No fazê-lo, prejudiquei a harmonia do lar, com carga de trabalho extenuante. Aliás, beirou a loucura.
Com cargos públicos erguidos de comando, por meio século, somados ao exercício da medicina, andei nessa toada até que me aposentasse.
Nesse 17 anos, sem a figura singela de minha mulher ao lado, tudo fiz para não me ‘enviuvar’ da alegria da vida. Os filhos se casaram, vieram-me os netos e bisnetos. Tive de me sujeitar ao recesso da casa.
Até hoje, enclausurar-me no apartamento não me é de todo confortável, dada a intensidade que imprimi aos meus dias. A solidão veio me abraçar. Não teve êxito: ela me encontrou junto do teclado do computador.
Empreendi atividades a que, hoje, nem de longe me habilitaria. Que bom — isso me alegra! — que nenhum filho ou neto seguiram meus passos. Não lhes ambiciono afazeres tão árduos.
Seja-lhes dita a verdade: não me esquivaria de promover uns ajustes bem pontuais. Afinal, trabalhei muito. Camelei. Mas desejá-los aos filhos, que judiação seria!
Se foram grandes os riscos de certas decisões — elas me fizeram um homem público —, não iria mais com tanta sede ao pote. Gostaria de ser apenas um médico generalista do interior do Brasil.
Não nasci com a genética da riqueza — rico não sou —, mas oportunidades concretas surgiram. Lembro-me de que assim que retornei à minha cidade natal, não me faltaram chances de ganhar dinheiro. Isso nos idos de 1964.
A primeira foi clinicar em Campo Grande, cidade em pleno progresso financeiro, sendo convidado a dirigir um hospital filantrópico novo.
Fui até a cidade morena e rejeitei o convite. Corria 1965. Estar próximo de minha família, nada valia tanto.
A outra, clinicar em Rondonópolis, cidade jovem, que foi a capital do agronegócio. Ano de 1966. Lá corria até muito mais dinheiro que em Campo Grande, e cedo poderia me tornar um grande fazendeiro.
Foram acertadas as duas decisões de permanecer em Cuiabá, tida como cidade pobre, abarrotada de funcionários públicos’. Pesou mais o lado familiar: atenção à mulher, filhos, pais e irmãos.
Em alguns momentos da vida faria ‘pequenos ajustes’. Acho difícil, numa existência longa, tendo uma hipotética possibilidade de revisão nas decisões, não alterar em nada a rota do passado.
Será que nunca errei? ‘O faria tudo igual’— parece mais um jargão semelhante a isto: ‘muitos falam da boca para fora’.
Palavras, apenas palavras! Que privilegiemos a vida! Por sinal, ela traduz um espetáculo imperdível!
Gabriel Novis Neves
4-7-2023
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