QUEM NÃO TEM CÃO, CAÇA COM GATO

Aprendi em casa, que “quem não tem cão, caça com gato” assim como “quem semeia vento, colhe tempestade”.

Como não pude realizar um sonho musical, por absoluta falta de talento para tocar violão, que muitos aprendem sem professor, vou tentar estudar gramática do nosso idioma – o português.

Já ganhei até um excelente consultor de gramática, e eu estou muito entusiasmado.

Instrumento musical pode ser tocado de ouvido, mas escrever corretamente o português só com um bom professor.

Aprendi a nossa gramática básica com o célebre professor Cesário Neto no Colégio Estadual de Mato Grosso, no curso científico, e aulas particulares na sua casa da rua 13 de junho.

Depois fomos colegas na universidade federal: ele, professor no departamento de letras; e eu, reitor.

Quase perdi o cargo de reitor por gratidão ao meu antigo mestre.

Ele era um gênio, e foi difícil para alguns compreendê-lo.

Cesário Neto foi concluir seus estudos no Rio de Janeiro, onde prestou vestibular e foi aprovado nas áreas das ciências médicas, exatas, educação e letras.

Matriculava-se, iniciava a frequentar o curso e, quando sentia que sabia mais que seus professores, abandonava por outro curso.

Assim, gradativamente, até retornar a Cuiabá, sem ter concluído o ensino superior.

Aqui fez concurso público para letras.

Passou em primeiro lugar e foi lecionar português no ensino médio do Estado.

Cesário Neto era um autodidata, poliglota, falava e lia fluentemente o esperanto.

Quando da implantação da UFMT, convidei-o para lecionar no departamento de letras, mesmo sabendo que ele não possuía curso superior, condição primeira para ser professor universitário.

Meu mestre de aulas inesquecíveis era um sábio, e lugar de sábio é ensinando.

Não tive dúvidas em assinar a portaria, contratando-o para lecionar na UFMT.

No concurso que fez posteriormente para sua efetivação, tirou o primeiro lugar.

Quando do reconhecimento do nosso curso de letras pelo Conselho Federal de Educação, no processo constava o nome do professor Cesário Neto.

Fui chamado ao gabinete do Presidente e atendido.

À época, eu era muito jovem e aparentava menos idade que tinha.

Muito desconcertado, o Presidente inicia a audiência com um conselho de pai para filho.

“O senhor é bastante jovem e tem um futuro promissor. O senhor não é obrigado a saber de tudo na administração de uma universidade. O senhor deve escolher bons auxiliares. Estou como relator do processo de reconhecimento do curso de letras da sua universidade. Veja isto aqui, e sublinhou o nome do mestre sem o curso superior. Esse é um erro grave, vou baixá-lo em diligência e o senhor o substituirá por um qualificado. ”

Na pausa da fala do relator e presidente, houve um silêncio apavorante no belo e amplo salão.

Com muito cuidado perguntei: o senhor já trabalhou com gênio?

Fiz um breve relato do meu professor e respondi: ele é um gênio.

O curso foi aprovado no plenário do CFE por unanimidade e o professor Cesário Neto se aposentou na compulsória como prof. adjunto da UFMT.

Quando não tem gente qualificada na universidade, convoca-se gênio.

Gabriel Novis Neves

22-09-2023