BRONCA NO MATUTO

Estava recém-chegado ao Rio para estudar e morava em pensão.

Fiz amizade com um colega carioca que morava com seus pais, em um belo apartamento da Praia do Flamengo.

Certo dia ele me convidou para estudar em sua casa depois do jantar. Um pouco antes das sete da noite estava na portaria do seu belo edifício.

Estava confuso com o número correto do apartamento. Procurei pelo porteiro que poderia me orientar corretamente. Não o encontrei.

No salão um jovem, um pouquinho mais velho que eu, muito bem vestido, parecia esperar por alguém que lhe viria a apanhá-lo de carro.

Inocentemente me aproximei dele e perguntei-lhe se sabia o número do apartamento do meu colega. Ele logo percebeu que eu era “matuto” e teve uma reação inusitada a minha pergunta!

Afastou-se um pouco de mim e disse com revolta: “você acha que estou vestido com roupa de porteiro? Veja os sapatos que uso e procure verificar o preço deles”.

E completou: “Quem fornece informações nas portarias dos edifícios aqui no Rio de Janeiro, são porteiros! ”

O ar do rapaz era de agressividade pela pergunta que lhe fizera.

Para minha sorte apareceu o porteiro que me encaminhou ao apartamento do quinto andar onde meu colega me esperava para “virar a noite”, estudando para o vestibular.

Fui apresentado aos seus pais, um casal de médicos, e depois nos dirigimos ao escritório da casa.

Lá relatei o episódio da portaria que muito constrangimento me causara.

Meu colega me respondeu dizendo que esse rapaz era problema para seus pais.

Nunca conseguiu aprovação para os diversos exames vestibulares que concorreu.

Seus pais tinham conseguido para ele frequentar um curso superior em recém-criada faculdade, numa pequena cidade do interior do Rio. Lá a presença dos alunos nas aulas não era obrigatória.

Ele projetou todos os seus fracassos em um menino vindo do interior do Brasil para se tornar médico.

Como é bom ser matuto e transformar sonhos em realidade em cidade grande! Também ser útil ao Brasil.

Gabriel Novis Neves

28-12-2021