segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Vida ao avesso

Tempos atrás fui entrevistado por um repórter que queria saber como eu, ainda bem jovem, havia assumido cargos públicos considerados de encerramento de carreira, e ter saído com boa avaliação por parte da sociedade, dos órgãos públicos nacionais e internacionais.
O curioso é que eu não dominava tecnicamente os cargos que ocupei. A encomenda saiu melhor que o pedido, como diz o bem humorado cuiabano para explicar esses casos.
Na ocasião alertei o jornalista que a minha vida estava sendo escrita toda ao contrário.
Subi todos os degraus dos meus estudos, do primário ao superior, com muito sacrifício e renúncias. Fiquei quase cinco anos, depois de concluído o meu curso superior, no Rio de Janeiro me preparando, única e exclusivamente, para ser médico do interior. Foram quase doze anos de ausência da minha cidade.
Aqui chegando recebi, como de praxe, dos meus colegas mais antigos, os chamados cargos sociais, apelidados de abacaxis, pela dificuldade em exercê-los sem se machucar com a desvalorização profissional preconceituosa, como eram vistos.
Coube-me a incumbência de dirigir o então Hospital Colônia de Alienados do Coxipó da Ponte, mais conhecido como a Chácara dos Loucos.
Dois anos depois fui convocado para ser o Secretário de Educação do Estado. Tinha três objetivos: substituir o então professor leigo do ensino primário por normalistas concursados; implantar modernos Centros Educacionais - cujo ensino tinha terminalidade; concretizar o sonho dos jovens do Estado continente, que era Mato Grosso não dividido, com duas universidades. A do norte, com sede em Cuiabá, e a do Sul, em Campo Grande.
Foi-me foi perguntado qual a metodologia empregada para executar com sucesso esses projetos. Respondi que utilizei o envolvimento emocional daqueles que trabalhavam comigo.
Essas tarefas, normalmente, são realizadas por técnicos especializados em final de carreira.
O que era considerado de ruim e péssimo para um profissional da área educacional ante tantas dificuldades a enfrentar, para mim foi o sol da minha vida.
Com tantas novidades passando pela cabeça de um jovem utópico, que apenas desejava e se preparou academicamente para o exercício da medicina generalista, foi quase um milagre, passado todas essas fases longas de trabalho macro, amadurecido, retornar ao consultório, onde permaneço até hoje.
A minha vida toda foi construída ao contrário. Só os privilegiados entendem essa dádiva, produto de muita doação de viver uma vida ao avesso.

Gabriel Novis Neves
25-10-2013

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