segunda-feira, 4 de novembro de 2013

ANIVERSÁRIO

É bom quando somos crianças e pensamos nos presentes que vamos ganhar no dia que comemoramos o nosso nascimento.
Até os meus dez anos de idade, quando já entendia que dia de aniversário era para ganhar presente, chegava da escola, almoçava e ficava na janela do meu quarto esperando os possíveis doadores.
Tinha um tio casado e sem filhos que, antes de ir para a repartição, pontualmente às 13h30m, apontava na esquina em direção à minha casa. Era o sinal que a escrita dos anos anteriores seria mantida.
Permanecia comigo o tempo suficiente para que eu abrisse a caixa do mimo e lhe fosse servido, por minha mãe, o bom-bocado que tanto apreciava. 
Logo saía para trabalhar, e eu voltava para a janela.
Outra visita constante era uma antiga amiga de minha mãe que, sempre protegida por um guarda-sol, também era portadora da esperada lembrancinha.
Tudo para ser programado com luz solar, pois a elétrica faltava com frequência.
A mesa com o bolo de velas, que só seriam sopradas com a chegada de todos os convidados, destacava-se no pequeno espaço da sala de nossa humilde casa.
A festa só acontecia realmente com a chegada do orador oficial dos aniversários, o professor Ezequiel de Siqueira com sua imensa coleção de cachorros. 
Figura folclórica na cidade. Fazia a criançada vibrar como se estivesse na presença de um mago das histórias infantis.  A sua fala era a mesma em todas as festas infantis e terminava sempre recitando uma poesia de autor desconhecido, talvez a mais linda da língua portuguesa pela sua simplicidade e ensinamentos.
As crianças daquela geração nunca se esqueceram da sua letra e mensagem: “Batatinha quando nasce se esparrama pelo chão, mamãezinha quando dorme põe a mão no coração”. 
Interpretem as informações, que muitos adultos desconhecem, como o nascimento das batatinhas, sem especificar a espécie, e a mãe totalmente despojada de sentimentos materialistas, traduzidos pelas mãos no coração. 
Quando a gente envelhece o aniversário passa a ser uma ameaça, e não mais motivo de celebração.  Passamos a temer a nova idade que ganhamos de aniversário. Muitas das nossas fantasias infantis desaparecem.  Para fugir da tristeza dessas datas usam-se vários meios artificiais, por exemplo: os aniversariantes tiram o telefone do gancho e ficam em casa tal reféns.  Estreei, no meu último aniversário, uma excelente maneira de me presentear: uma ótima viagem não programada. E gostei.  Chegamos numa idade onde tudo é permitido, inclusive, ser feliz no dia do aniversário.

Gabriel Novis Neves
16-10-2013

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