Era o primeiro dia útil do mês de março de 1942.
Eu morava na rua de Baixo com meus pais e mais três irmãos: Yara, Pedro e Inon.
Acordei cedo, pois sabia que seria o meu primeiro dia de aula.
Não conhecia nenhuma escola, não frequentei a pré-escola, não possuía coordenação motora e era totalmente analfabeto, sem saber ler ou escrever.
Minha mãe me deu o café com leite e me vestiu do uniforme da escola confeccionado por ela.
Calça curta e túnica caqui de mangas compridas fechada com botões marrons, forrada com linho branco cobrindo a parte superior do tórax e os ombros.
Cinto e sapatos com meias pretas.
Em uma pasta escolar minha mãe colocou um caderno de caligrafia, o livro do 1º ano primário, um lápis preto, borracha, apontador de lápis e a merenda.
Estava pronto para sair de casa em direção à escola quando a minha mãe, na porta da nossa casa, chega pertinho ao meu rosto e disse:
“Siga pela calçada em linha reta e logo você encontrará uma bonita praça cheia de crianças como você.
Uma senhora que lhe conhece e sabe o seu nome, pois eu à recomendei, virá ao seu encontro.
É a sua professora, que todos chamam de Oló, mas, o seu nome é Aureolina Eustáquio Ribeiro, excelente alfabetizadora e amiga da sua mãe.
A diretora você conhecerá depois e chama-se Aline Tocantins.
Meu filho você está entrando na escola com menos de sete anos e até agora você só aprendeu a brincar, cuidar dos seus irmãos menores e jogar xadrez com seu avô.
A escola é um lugar onde só existe a porta de entrada e nunca a da saída, e essa é a estrada que você irá percorrer para ser um homem útil aos semelhantes.
Poucas crianças têm essa oportunidade que você está tendo de frequentar uma escola, e o seu futuro só depende de você.”
Disse essas palavras para mim e me beijou na testa.
Cheguei à Praça Ipiranga e fui recebido carinhosamente pela professora Oló e orientado por ela.
Logo o bedel da escola, vestido de terno e gravata, toca a sineta de mão, avisando aos alunos dos quatro anos primários para se perfilarem em posição militar por ordem de altura para cantarem o Hino Nacional Brasileiro com o hasteamento do Pavilhão Nacional.
Terminada a solenidade, que era diária, cada professora levava seus alunos em fila indiana para suas respectivas salas de aula.
Para mim tudo que aconteceu naquela manhã era novidade.
Eu não conhecia sala da aula, carteira de madeira maciça para dois alunos, mesa e cadeira da professora, quadro-negro, giz e apagador.
No canto da sala havia um pote colocado em cima de um banquinho de madeira coberto por uma toalha bordada de linho.
Dele os alunos retiravam, através de uma caneca de alumínio, água para beber.
Naquela época o nome do sanitário da escola, era chamado de “breve” e para usá-lo durante as aulas tínhamos que pedir permissão à professora.
Para saber se o sanitário estava desocupado o pedaço de madeira deveria estar na mesa.
Após o pedido à professora ela sempre respondia: “não demore”.
No recreio os meninos carentes tinham permissão para ir ao pátio receber a merenda escolar do Estado, e era geralmente pão francês sem manteiga com um pedaço de rapadura de cana.
Os mais abonados compravam bolos, salgadinhos e doces das famosas especialistas cuiabanas, como bolo de arroz, de queijo, de polvilho, francisquito e mãe-benta.
Os de classe média traziam a merenda de casa.
Foram quatro anos de muita aprendizagem, e logo estava no Colégio dos Padres continuando os meus estudos.
Terminei o primário com distinção, sabendo ler e escrever.
Gabriel Novis Neves
26-06-2023
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