quarta-feira, 28 de junho de 2023

ANOS DECISIVOS DA MINHA VIDA - ESCOLHA DA MEDICINA


Com a minha aprovação no vestibular de medicina (janeiro 1955) tudo começou a melhorar em minha vida.


A faculdade era gratuita e o restaurante anexo cobrava um preço simbólico, que não aumentou nos seis anos que lá estudei.


No primeiro dia de aula de Embriologia, o professor Bruno Alípio Lobo, nosso querido Bruninho, nos garantiu que seríamos médicos.


Só um “acidente biológico” poderia nos impedir de concluir o curso, que jamais aconteceria por vias acadêmicas, como reprovações sucessivas e jubilação.


Contrariava a minha mãe em 1942, quando me encaminhou ao Grupo Escolar e me disse que a escola só tinha a porta de entrada.


A faculdade de medicina possuía uma porta de entrada que só abria pelo vestibular, e a da saída, após seis anos de permanência lá, com habilitação para exercer a profissão de médico.


Aproveitava a sobra da mesada que o meu pai me enviava para comprar livros técnicos em francês e espanhol do livreiro Luís, que ficava no amplo salão da faculdade, ao lado da engraxataria.


Andava sempre de “Bonde da Light nº 4”, cujo preço era subsidiado pelo governo federal e não foi alterado durante os anos que estudei medicina.


Nessa época morava na rua Almirante Tamandaré nº 67 no bairro do Flamengo.


O porteiro da faculdade era um senhor claro, cabelos grisalhos abundantes, vestido de terno e gravata com enorme avental branco e comprido.


Para quem não o conhecia era tratado de professor, ou até diretor.


Não conversava com calouros, só com alunos depois do terceiro ano.


Tinha prazer em dizer que fez amizade com o Noel Rosa, o poeta da Vila, quando era aluno de medicina.


Lamenta que ele tenha deixado os estudos pela boemia, vindo logo a falecer.


Comentava que o primeiro aluno da faculdade que chegava às aulas dirigindo o seu próprio carro, era o paulista Adhemar de Barros.


Fazia questão de mostrar a gigante figueira, árvore onde o Adhemar estacionava seu carro, debaixo dos galhos de folhas, que oferecia sombras generosas.


Dizia para quem quisesse ouvir que o Adhemar era “rico de berço”, quando ele esteve na faculdade para abraçar o “seo” Magalhães e lhe pedir o voto para ser Presidente do Brasil.


Fui aluno dos melhores professores do Brasil!


Carlos Chagas Filho, filho do célebre pesquisador Carlos Chagas, descobridor da “Doença de Chagas. “


Meu professor, Chaguinhas, catedrático da disciplina de Biofísica era um dos consultores científicos do Papa.


Professor Cavalcante, de Anatomia, Paulo Lacaz de Bioquímica, Paulo de Góis de Microbiologia.


Thales Martins catedrático de Fisiologia, disputou e perdeu o Nobel de Medicina para o argentino Houssay, em cujo livro estudei.


Paulo Carvalho, de farmacologia, que em 1957 disse na aula que havia fumado maconha em laboratório para uma pesquisa científica, e não sentiu nenhum efeito colateral.


Seu assistente paraense defendeu tese sobre o curare usado pelos índios nas pontas das flechas para imobilizar suas vítimas.


Cruz Lima, catedrático de Semiologia Médica, extremamente didático e respeitado pelos seus pares.


Emocionava os estudantes, mas nunca contou a tragédia familiar pela qual passou.


Sua filha foi acometida de rubéola na gestação, e sua neta nasceu cega com defeitos nos membros.


O pai da criança, Nelson Rodrigues, escreveu uma peça de teatro que fez o Brasil chorar.


Clementino Fraga Filho, de Clínica Médica, Júlio de Moraes (gastro), José Augusto (nefro), Magalhães Gomes (cardio), Portela (ortopedista), Mariano de Andrade, Pinheiro Guimarães de Clínica Cirúrgica.


Rodrigues Lima (obstetrícia), Arnaldo de Moraes (ginecologia), Martagão Gesteira (pediatria e puericultura), Abreu Fialho (oftalmologista), Capistrano Pereira (otorrino), Manfredini (psiquiatria), Deolindo Couto (neurologista), Sílvio Fraga (dermatologista).


Cada professor catedrático possuía vários assistentes excepcionais, impossíveis de serem relatados numa simples lista.


Em 1959 conquistei por concurso o direito de ser interno remunerado no Hospital Maternidade Pro Matre, e no Hospital e Pronto Socorro Municipal Souza Aguiar.


Em 15-12-1960 recebi o título de graduado em medicina, pela Faculdade Nacional de Medicina da Universidade do Brasil, podendo exercer a minha profissão de médico em todo o território nacional.


Gabriel Novis Neves

29-06-2023




Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.