sexta-feira, 19 de maio de 2023

HISTÓRIAS INFANTIS


As crianças da minha geração cresceram ouvindo dos adultos muitos contos infantis.


As empregadas da casa, geralmente analfabetas, eram as grandes contadoras dessas histórias.


Eram histórias de dar medo às crianças, tornando-as inesquecíveis.


Quem da minha geração não se lembra das histórias do “pé de garrafa”, da “mula sem cabeça”, da “alma d`outro mundo”, do “lobisomem”, com terror?


À noite as crianças sempre se reuniam para ouvir as “histórias do medo. “


Lembro-me que certa noite estava na casa do meu avô Dr. Alberto Novis sentado no chão da porta da rua com outros primos.


Veio a empregada do meu avô e começou a contar histórias terríveis sobre o cemitério da Piedade.


A casa do meu avô ficava na rua Voluntários da Pátria, antiga travessa da Alegria, quase esquina da rua de Cima.


Era em frente à casa do “seo” Anastácio e sua sapataria, colada à casa da dona Balbina, viúva do dono da Casa Orlando na rua de Baixo, antiga rua do Oratório.


Dona Balbina era famosa pelos presépios que construía no Natal.


Era todo mecanizado com seus personagens movimentando-se, para a alegria da meninada.


Seu casarão era assobradado, um dos mais lindos de Cuiabá nos anos quarenta.


A rua Voluntários da Pátria surgiu após a Guerra do Paraguai (1964-1970) em homenagem aos “Voluntários da Pátria” que foram combater as tropas paraguaias de Solano Lopez em terras brasileiras.


A iluminação pública não chegava com seus postes até à rua do Campo.


Essa rua terminava no cemitério de Cuiabá, fonte de muitas histórias que nos eram contadas.


Naquela época existia “alma do outro mundo” que saía à noite do cemitério.


As crianças tinham pavor em encontrar as “almas” daqueles que já tinham morrido!


Uma noite, a contadora de história nos desafiou a sair da porta da casa do meu avô e chegar até o último poste com lâmpada acesa.


Eu não fui por medo, e quem enfrentou o desafio retornou antes da meta, que era o poste iluminado.


Como a gente acreditava nas histórias que nos eram contadas, morríamos de medo.


Bons tempos aqueles que crianças tinham medo daquilo que existia apenas na cultura popular, bem diferente dos dias de hoje.


Temos sequestros, estupros, roubos, fome, desnutrição e cada vez mais distanciamentos sociais, produzindo todas as formas de violência às crianças e adultos.


Atualmente todas essas histórias não são mais contadas pelas empregadas porque deixaram de existir, e foram substituídas pelas funcionárias e pelos próprios pais das crianças.


Mas o pavor ainda presente entre as crianças que assistem à TV, e tudo dá medo, especialmente à noite.


Gabriel Novis Neves

13-05-2023




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