Bem antigamente, ricos e pobres casavam nas suas cidades. Hoje, isso é privilégio de pobres que casam em casa, sem necessidade do cartório ou Igreja. Recepção só se for rachadinha. Não vale cortar a gravata do noivo para angariar fundos para a lua de mel.
Na Cuiabá antiga, assisti a muitos casamentos de pompa, que eram aqueles que a noiva chegava na Igreja de carro com o seu pai, vestida de branco, véu, grinalda e um buquê de rosas brancas. Essa vestimenta era guardada e utilizada no casamento das suas filhas. O buquê de rosas era jogado pra suas amigas. Hoje, o casamento é quase secreto e, incluindo o cerimonial, bufê e show dos cantores sertanejos de Goiás, só é possível para o pessoal do agronegócio cujas despesas são lançadas em nome das suas empresas, para abater no Imposto de Renda.
Bem antigamente, era comum o cidadão depois de tomar uma boa dose de pinga, subir correndo o arco da Ponte Júlio Muller e saltar gritando a plenos pulmões – “Bandeirantes no Ar”. “Bandeirantes no Ar”, foi o primeiro noticiário radiofônico organizado por Augusto Mário Vieira em 1952, sendo transmitido pela rádio a voz D´Oeste, cujo prefixo era PRH3 e ZYZ5. Hoje, quem fizer isso é louco e internado no Hospital Adauto Botelho.
Na Cuiabá antiga, passar caminhando pelas pistas de pedestres da ponte, era um bom programa para os domingos à tarde e feriados. Ninguém pensava em subir correndo esse arco e, se jogar no Rio Cuiabá, cheio de peixes. Hoje, atravessar a Ponte, só de veículos por causa da violência.
Bem antigamente, diz a lenda que existia na Santa Casa da Misericórdia de Cuiabá, um “enfermeiro” que era prático chamado de Antônio Amaro, de extrema confiança do seu Presidente perpétuo Dr. Zelito. Era o responsável pelo “chá da meia-noite”, uma beberagem que, diziam, era oferecida aos doentes mais graves, à meia-noite, para que “passassem desta para outra melhor”. Hoje, os doentes graves não são mais internados por falta de vagas, não havendo mais necessidade do “chá do Antônio Amaro” e, esses pacientes passam para uma vida melhor em casa mesmo.
Na Cuiabá antiga, existia a nossa Santa Casa da Misericórdia, e nunca um paciente grave voltava para casa por falta de vagas. As irmãzinhas administradoras sempre encontravam um leito. Hoje, a Santa Casa da Misericórdia de Cuiabá, após uma série de escândalos com o afastamento das irmãzinhas, foi transformada em Hospital Regional de Cuiabá pelo Governador Mauro Mendes e, é administrado pela secretaria estadual de saúde, mantendo em dia o pagamento dos seus funcionários e, fornecedores.
Bem antigamente, Cuiabá tinha fama de ser uma cidade hospitaleira, recebendo os visitantes sempre com muito carinho e atenção. Quando aparecia alguém estranho, logo era interpela-lo com uma conversa mais ou menos assim:
- Tudo bem? Você não é daqui, de onde é?
-Veio a passeio ou a trabalho?
- Vai fazer o que, agora?
- Tem uma “brincadeira” na casa de um amigo, você não quer ir lá comigo, tomar uma cerveja? Pronto! Ali começava uma amizade às vezes duradoura. Minha mãe, era especialista nessas abordagens com as senhoras chegantes, criando muitas amizades duradouras com as pessoas que vinham de fora para trabalhar aqui. Hoje, quando encontramos com desconhecidos, já sabemos que vieram do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, para trabalhar no agronegócio, ficarem ricos e morarem em mansões no litoral da Santa Catarina. Quando não inventam em ser políticos.
Na Cuiabá antiga, sua população praticamente era de nativos, educados com essa hospitalidade aos que vinham de fora. A Cuiabá cosmopolita vive enjaulada nos edifícios, pouco conhecendo seus vizinhos. Hoje, como as pessoas não se encontram e há um precipício separando as classes sociais, até o hábito de colocar apelidos nas pessoas está desaparecendo, sendo cultuado pelos maiores de setenta anos. Sinto saudades de “Pedra Canga” que é uma variedade de pedra com superfície muito irregular, que pode se comparar a um rosto cheio de acne, apelido que ganhava aqueles que apresentavam o rosto com essas cicatrizes. Uma história muito contada por estas bandas, foi de um turista que ficou hospedado no extinto Grande Hotel de Cuiabá, com receio de ganhar um apelido dos antigos cuiabanos. Não saiu do quarto e de vez em quando saía à janela do seu quarto para contemplar a Praça Alencastro, a Matriz e o movimento do nosso Centro Histórico. Após repetir por vezes essa cena, ouviu alguém chamando por ele – “Olá Cuco, desce aqui para conversarmos”. Cuco, era aquele passarinho do relógio, que a cada hora colocava a cabeça para fora de sua janelinha e anunciava as horas: cuco-cuco-cuco. Essa era a minha Cuiabá!
Gabriel Novis Neves
04-09-2022
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