Não só as calçadas dos casarões da minha infância eram sala de visitas, como as janelas eram pontos de conversação.
Ao anoitecer todos os antigos moradores, após o lanche, colocavam as suas cadeiras de balanço na calçada da porta da sua casa para espiar o movimento e conversar com que passava.
Na boca da noite era com aqueles que iam ao Jardim, ou voltavam do trabalho.
Também aqueles que iam visitar amigos ou parentes.
No início do primeiro mandato do governador Fernando Correa da Costa eu ainda morava em Cuiabá.
Após ler os jornais do Rio e São Paulo, levados diariamente na Residência dos Governadores, pelo seu colega e amigo Dr. Antônio Pereira Leite, saia para visitar parentes e amigos.
Parava na porta da minha casa para um papo, já que era primo da minha mãe.
Na volta da casa da Bem Bem, sua prima, muitas vezes não encontrava meu pai na cadeira de balanço, pois tinha se recolhido para dormir.
Esse era o comportamento das famílias cuiabanas: sentar-se às portas das calçadas para receber visitas e conversar.
Já o historiador Estevão de Mendonça, gostava de conversar debruçado na janela do seu quarto.
Quando as pessoas caminhavam pela calçada em frente, ele chamava para conversar.
Seu filho, também historiador Rubens de Mendonça, herdou esse hábito do pai, e muitas vezes nos entregava pela janela do seu escritório as suas famosas quadrinhas.
As janelas das casas eram de madeira, e a parte superior geralmente era de vidro, e a inferior veneziana, inclinadas para baixo e horizontais na parte superior.
Servia para as mães fiscalizarem as chegadas das suas filhas com os namorados e, principalmente as despedidas.
Com a urbanização de Cuiabá, desapareceram as salas de visitas nas calçadas das portas.
A descoberta das janelas de ferro com vidro, substituíram as antigas de madeira, e as outras utilidades, como bisbilhotar a vida daqueles que passavam pela rua sem seres vistos.
As reuniões passaram a ser realizadas em casas protegidas por muros.
Enquanto morei na casa da Major Gama, escondida por alto muro de pedras, no caminho do morro do Tambor, no Porto, as reuniões eram diárias e com uma plateia eclética.
Eram políticos de todas as correntes ideológicas, de vereador a governador.
Professores universitários, artistas plásticos, jornalistas, radialistas, dono de televisão, colonizadores, amigos, parentes e vizinhos.
Um dos mais assíduos frequentadores dessas saudosas rodas de conversa era o nosso querido “poetinha” Augusto Mário Vieira.
Protegido da minha mulher Regina, a grande incentivadora desses encontros, certa vez fez uma profecia.
Sua casa é o último ponto de encontro dos cuiabanos.
Ele deputado, teve um infarto violento e nos deixou.
Eu há trinta anos moro em uma torre de apartamentos, e ninguém me visita, e nem eu visito ninguém.
Gabriel Novis Neves
30-06-2022
Fotografias do acervo do Sr. Francisco das Chagas Rocha:
Fotografia do acervo pessoal do autor:
Eu e Regina sentados no batente da porta da casa da "Rua do Campo |
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.