Entre
as inúmeras lembranças que guardo da minha longínqua infância, é a de uma
senhora que morava em frente a minha casa e tinha mania de limpeza.
Ela
já acordava com uma vassoura de pelo na mão direita e outra na mão esquerda.
Sobre os ombros um pano úmido limpíssimo para apagar vestígios de qualquer
mínima poeira. Esse era seu primeiro serviço do dia – a limpeza da casa.
Seu
orgulho era dar brilho aos lindos ladrilhos importados que cobriam abundantes
metros de piso do casarão imperial.
Tinha
pavor de casa desarrumada e suja. Ela morava com os pais e, para ela, casa onde
vivam idosos tinha de estar constantemente limpa.
Quando
os pais recebiam visitas – naquela época ato muito corriqueiro – ela as
encaminhava à sala, mas ia atrás limpando a trajetória.
Participava
das conversas com a vassoura ao seu lado. Na saída ela repetia o ritual.
Ninguém
se incomodava, pois todos conheciam os hábitos da casa que não podia sujar.
Além
da limpeza, suas cristaleiras europeias estavam sempre repletas de guloseimas
feitas por ela.
Até
o almoço ela preparava, pois “cozinheira suja muito a cozinha e não sabe
limpar. Prefiro fazer tudo” - dizia sempre.
Mantinha
uma bela horta no quintal. De lá tirava folhas e legumes para a esmerada
travessa de salada, nunca do agrado do cuiabano. O forte eram as raízes.
Ao
lado o galinheiro, com produção diária de ovos, frango para sopa de enfermos e
a galinha para o almoço de domingo com macarronada. A sobremesa era sempre de
frutas da ocasião.
Leite,
carne bovina, de suínos, queijo, doce de leite, lenha para o fogão, vinham da
chácara da Guia.
O
pão era o caseiro, nunca de padarias “imundas e sem higiene”.
Cresci
com aquela imagem de organização caseira, em uma época em que não havia
geladeiras e a nossa energia elétrica fazia parte do nosso folclore.
Todo
alimento produzido no dia tinha de ser aproveitado, ainda mais com o nosso
clima desértico.
A
verdade é que em todas as casas existia ao lado da porta da cozinha para o
quintal, uma lata vazia de banha de porco para receber as sobras de comida.
No
dia seguinte, em horário pré-determinado, aparecia o criador doméstico do suíno
para levar a alimentação.
As
crianças do século XXI jamais terão essas lembranças. “Éramos felizes e não
sabíamos”.
Gabriel Novis Neves
27-12-2013
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