sexta-feira, 2 de setembro de 2022

REVIVENDO OUTRO FILHO DO BUGRE E DA IRENE


Por Maria Manuela Renha de Novis Neves


Pedro foi o terceiro na fila dos "Noves Neves". Reza a lenda familiar que, assim como Olyntho detinha certa preferência do Bugre, o Pedro era o "xodó" da Irene. Existe relevância na criação dessa lenda, mas a ideia não é explorá-la, apenas algumas referências cabíveis. Também não se trata de contar a trajetória de vida do Pedro, algo que merece mais atenção. O objetivo é com um ou outro fato, às vezes até curioso, lembrar o aniversário do Pedro hoje, 03 de setembro, um dia após o da Irene.


Dizia o Pedro, na intimidade familiar, fantasiando ou não (e ele gostava de fantasiar certas coisas pra brincar, por criatividade ou para surpreender as filhas), que no início da sua gestação pensavam ser uma pedra nos rins da mãe. Nunca esclareci essa história com a Irene.


A lenda da "pedra" (ou não) trouxe ao mundo um Pedro, nome do Apóstolo a quem Cristo delegou a missão de zelar pra manter viva a Sua palavra. E, como já foi dito por Gabriel, o dia de São Pedro, especial para o Bar do Bugre, transformou-se, pelas mãos e pela fé da Irene, no dia da reverência familiar a São Pedro, tradição mantida até os dias atuais.


O Pedro, Gabriel e Inon, estudaram e se formaram no Rio, mas Pedro jamais esqueceu a professora Kalu, grata lembrança da escola em Cuiabá.


Gostava de contar as traquinagens da infância, com muita parceria do Mario Vidal, os sustos que pregavam nos outros e do gosto que isso lhes davam.


Aliás, manteve o gosto de pregar sustos já adulto e era comum ouvir da Irene, num misto de mãe zelosa e com rigor de quem conhecia muito bem o seu xodó, a seguinte frase - "Pedro, você brinca parecendo estar passando mal e um dia pode ser verdade e ninguém vai acreditar pra socorrer".


A pitonisa Irene acertou pelo menos uma vez. Pedro caiu de mau jeito na piscina da nossa casa, afundou e não voltou à tona. Manhã de sábado, casa cheia, sobrinhos e amigos em volta da piscina achando graça na "brincadeira" do Pedro. Foi Mauro Pedrosa, meu afilhado, que desconfiou da demora, mergulhou e o resgatou. Pedro tinha batido os joelhos e não conseguia emergir. Grande susto e uma cirurgia no joelho.


Muitos se perguntarão os motivos destas historinhas bobas, em vez da trajetória do Pedro ou de focar mais na tal preferência da Irene pelo Pedro. Como já disse, não é intenção explorar uma ou outra neste momento. Só reviver fatos esparsos e nem sempre conhecidos, mas que também são parte do Pedro, ou daquela feição meio '"criança levada" do Pedro.


Quanto à ligação Pedro e Irene são muito fatos que também não cabem aqui e agora. Basta falar nas cartinhas cheias de recomendações na letra bonita da Irene que o Pedro herdou, algumas poesias, o carinho de morarem juntos certo tempo em Cuiabá, as acolhidas grudadas no Rio quando ela vinha por aqui, a aceitação das escolhas da mãe pós viuvez, os cuidados dela, até quando chamava sua atenção pelo bem dele. Uma admiração e amor profundo entre eles. Nunca ouvi o Pedro fazer uma crítica à mãe. Tinha irrestrito orgulho dela, com chuva ou com sol.


Ouso dizer que, meio secretamente, o Pedro compensava uma outra lenda só dele, achando - se um tanto preterido pelo Bugre (sabidamente mais ligado ao Olyntho) sendo, então, ele, Pedro, o preferido pela Irene. Não era uma disputa, nunca ocorreu nada desse tipo entre os dois irmãos, mas o Pedro cultivava como dádiva a preferência amorosa e cuidadosa da mãe.


Quando a mãe faleceu, nós aqui no Rio, recebi a notícia no meio da madrugada. Foi quase um ritual o meu cuidado em dar-lhe a notícia porque sabia do apego entre eles. Ele chorou muito e eu, tentando ajudar, disse que marcaria de imediato a passagem dele para o velório e enterro. A reação foi inesperada - " Não vou. Não quero ver minha mãe morta. Quero ela viva, viva". Claro que foi! Aquela era apenas uma reação drástica pelo desespero da perda de quem tinha sido o centro da sua vida, sentindo-se amado desde a lenda de ser uma "pedra nos rins”.


Mas quero encerrar esta mínima homenagem ao aniversário do Pedro e, de certo modo da Irene, de um modo mais parecido com a alegria dela e a reverência dele a tudo que vinha dela. E o faço a pedido das minhas filhas, Janaína e Manaíra, que cultivam uma das muitas heranças da Irene no Pedro. Ele repassou para as filhas e elas repassam para os nossos netos e bisnetos da Irene (Rafael e Pedro Paulo).


Irene escrevia bem e até arriscava umas poesias. Gostava de cantar e dançar em casa. Sempre alegre, acordava a numerosa criançada logo cedo para a escola já com essa alegria pra espantar o mau humor dos filhos ao serem despertados para as obrigações escolares. E o fazia cantando uma musiquinha que grudou no seu xodó Pedro e dele para minhas filhas e agora pra nossos netos. Que este traço de amor que sobrevive no tempo seja capaz de traduzir a lembrança feliz que Pedro e Irene merecem e o amor que os unia. Segue abaixo a letra da musiquinha e, junto, aqui do Rio, nossa saudade e afeto por ambos.


“Erguei-vos dorminhocos que o galo já cantou.

Já faz bastante tempo que o sol se levantou.

Erguei-vos, erguei-vos, erguei-vos

dorminhocos …”.


03/09/2022









Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.