quarta-feira, 12 de julho de 2023

NASCEU COMIGO


Recebi a visita de um rapaz que nasceu comigo de parto normal, com três quilos.


Chorou alto, urinou e defecou assim que saiu do útero materno, antes da saída da placenta.


O dia e a hora foram determinados por ele.


Todos esses itens citados foram para esclarecer que a sua mãe teve uma gestação saudável e ele nasceu em boas condições de nutrição e vitalidade.


Acompanhei o seu crescimento, vida escolar, namoro, noivado e só não fui ao seu casamento por ser fora de Cuiabá, e eu ter dificuldade de locomoção.


Colocou em prática o "quem casa, quer casa, longe da casa que se casa".


Há onze anos comprou dois lotes de terrenos em um condomínio que estava nascendo, e construiu aos poucos a sua casa própria.


Casado há cinco anos foi o seu décimo primeiro morador, e na ocasião não existia nada na região.


Hoje existem mais de cento e vinte casas habitadas, e o loteamento tem tudo de primeira necessidade, inclusive uma farmácia de uma grande rede que entrega em casa seus produtos.


É um profissional de sucesso na sua área profissional, está consolidado, tudo isto com pouco mais de trinta anos.


Estudioso, é conferencista e escreve artigos técnicos para revistas especializados.


Com o mestrado completo feito em Brasília, Sorbonne e Roma, pretende fazer um concurso público para docente na nossa universidade.


Sua mulher também trabalha em setor público especializado, tendo demonstrado grande competência técnica e ética.


Programaram a chegada dos filhos, aproveitando essa lua de mel esticada para viajar pelo Brasil e mundo afora, aumentando o seu capital cultural.


Veio me comunicar que passará quinze dias entre Israel e Dubai, pois conhece grande parte da Europa, inclusive esteve na Noruega para assistir a Aurora Boreal.


Já esteve pelo México, Estados Unidos e o Canada, e fala fluentemente o inglês.


Muitos me perguntam qual a diferença dos jovens da minha geração para a atual.


É simples.


A minha geração programava a vida, como o economista Delfim Neto nos longos anos quando foi o responsável pela economia do Brasil.


Ele ensinava: “deixemos o bolo crescer no forno, para depois dividi-lo entre todos. ”


O forno do fogão da nossa economia nunca conseguiu fazer o bolo crescer, e ele nunca foi dividido entre os trabalhadores brasileiros.


Em pleno século vinte e um, somos um país carente em saúde, educação, saneamento básico, segurança pública, distribuição de renda, empregos e transportes públicos.


Minha geração é de família numerosa, com oito, nove, quinze filhos.


Era uma dificuldade cursar uma universidade, precisando sair de Cuiabá.


Ao voltar, logo se casavam, vinham os filhos em números reduzidos, com média de três.


Trabalhavam dia e noite, sem férias e nada de supérfluos.


Eu morava em casinhas alugadas com pouco conforto, e guardava a economia para crescer, para construir a minha casa própria.


Só consegui deixar as casinhas alugadas, com mulher e três filhos, após treze anos de concluído o meu curso de medicina.


Meus três filhos fizeram “cursos Imperiais” em universidades brasileiras.


Encaminhei-os após formados, casados e instalados, na falsa ilusão, de “é chegada a hora de dividir o bolo”.


Veio uma doença traiçoeira e levou para outro plano espiritual, minha esposa, mãe dos meus filhos, nove anos mais nova que eu.


O “bolo” ficou sem dividir e eu não fiz nada que deveria fazer, mesmo quando o “bolo estava esmirradinho”.


Para encurtar esta longa história da criança que nasceu comigo há trinta e quatro anos, a geração atual está melhor preparada que a minha, que esperou o “bolo crescer” para passear e conhecer o mundo.


Gabriel Novis Neves

30-05-2023




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