ANOS DECISIVOS DA MINHA VIDA
Os primeiros dias de Cuiabá e os últimos cinco meses de 1964 foram de felicidade pela chegada da Monica, apoio dos colegas mais antigos e novos e dificuldades a vencer.
Desde o início de 1965 a Regina queixava-se de enjoos matutinos.
Naquela época não tínhamos o exame laboratorial da dosagem do BHCG ou ultrassonografia para o diagnóstico precoce da gravidez, e ela ainda amamentava e não menstruava.
O exame era feito em sapos, abundantes em Cuiabá, chamado de reação de Galli Manini.
Regina estava grávida e seu parto programado para a primeira quinzena de setembro.
Ricardo nasceu de parto normal na Maternidade de Cuiabá, em 13 de setembro de 1965 pelas mãos de Clóvis Pitaluga de Moura, aumentando a felicidade e alegria da nossa casa.
Eu precisava urgente pagar os aluguéis vencidos da nossa casa, comprar um telefone fixo, um automóvel usado e um horário em consultório de um colega, e não tinha dinheiro.
Carlos Eduardo Epaminondas, meu colega desde o curso primário no Grupo Escolar da Praça Ipiranga, companheiro de quarto em pensão no Rio de Janeiro e faculdade de medicina, sabedor da minha situação se dispôs a me ajudar.
Ele me apresentou ao gerente do Banco Real, Beto, mais tarde dono da mais chique lanchonete da Presidente Vargas, o Bar do Beto.
Fiz um empréstimo bancário para comprar o aparelho telefônico e um Dauphine bastante usado, tendo como corretor o Moises, sucessor de Antônio Amaro na Santa Casa.
Era o carro mais barato que encontrei e ele funcionava como por milagre.
Vivia na oficina do Almiro Saraiva, na Prainha, e seu maior problema era o motor de arranque, entre outros.
Seu destino seria o cemitério dos carros para o desmonte e venda de algumas peças inexistentes no mercado.
O secretário de saúde era amigo do Carlos Eduardo.
Uma tarde ele me acompanhou ao gabinete do colega e lhe disse: “secretário, o Gabriel precisa trabalhar. ”
Ele me olhou e respondeu: “em Cuiabá não tem vaga para você trabalhar.”
Se quiser ir para Rosário Oeste, Alto Paraguai, Poxoréo ou outras cidades desse porte eu tenho como lhe nomear.
Isso foi em 1965, e em 1966 assumiu o Governo do Estado Pedro Pedrossian, engenheiro ferroviário filho de migrante armênio, nascido em Miranda, no sul do Estado.
Escolheu como secretário de saúde, o renomado médico cuiabano Clóvis Pitaluga de Moura com um problema urgente para resolver: o Hospital Colônia de Alienados do Coxipó da Ponte.
Clóvis me indicou ao governador como o único médico capaz de cumprir essa missão, embora não fosse um especialista, mas pelo meu perfil.
Coisas da vida: há um ano não existia vaga para mim em Cuiabá.
Agora eu era o único medico capaz de resolver esse problema da secretaria de saúde!
No início de 1966 tinha o meu salário de médico do Ministério da Saúde.
Era “bagrinho” do Clovis Pitaluga no SAMDU (Serviço de Assistência Médica Domiciliar e Urgência).
Uma vez por semana era responsável pelo plantão de 24 horas na Maternidade de Cuiabá (alcançável e não remunerado), substituindo Clóvis Pitaluga.
Em compensação ele me chamava para auxiliar em algumas das suas cirurgias, cujo valor era suficiente para vivermos durante um mês.
Também frequentava a Santa Casa e mesmo não tendo clientes, auxiliava as cirurgias dos colegas de pacientes pagantes ou não, os indigentes.
Atendia a “Portaria da Santa Casa”, que funcionava como “Pronto Atendimento” da cidade.
Ficava o final da tarde no corredor do consultório do Lotufo, no primeiro andar de um prediozinho comercial, do Urbano de Arruda, próximo à Praça Ipiranga, para atender um ou outro paciente que chegava sem médico.
Entrei em um consórcio de sessenta pessoas, para o sorteio mensal de um fusquinha zero quilômetro, administrado por Vilanova Torres, coronel Torquato e Omar Canavarros.
Fui sorteado na terceira rodada, e desde então automóvel não foi mais problema em minha casa.
Em 15-03-1966 Pedrossian tomou posse como governador do Estado de Mato Grosso e nomeou Clóvis Pitaluga de Moura secretário de saúde.
À noite no Palácio Alencastro o novo governador e senhora ofereceram o Baile de Gala da posse aos poderes constituídos e sociedade mato-grossense.
Para animar a festa foi contratado o cantor Miltinho, sucesso na época.
No outro dia à noite, para minha surpresa e da Regina, foi nos visitar Clóvis Pitaluga.
Ele foi até a minha casa para me convidar para se diretor do Hospital dos Alienados, conhecido como “Chácara dos Loucos. “
Para mim seria um péssimo negócio aceitar o convite, pois eu ia bem na medicina que escolhi para trabalhar.
Mas não podia dizer não ao Clovis, de comum acordo com a Regina.
Só o nosso sentimento de gratidão garantiu esse ato.
No dia 17 de maio de 1967 a nossa casa ficou maior com o nascimento do nosso terceiro filho na Maternidade de Cuiabá, parto cesáreo realizado por Clóvis Pitaluga, padrinho do nosso caçula – Fernando Gabriel.
Os resultados todos conhecem: mudei o nome do hospital para Adauto Botelho e demos dignidade aos doentes mentais.
A nossa gestão foi aprovada pela sociedade, e meu mandato interrompido no início de maio de 1968 para exercer o cargo de secretário de educação com a missão de implantar duas universidades.
A Federal, com sede em Cuiabá, e a Estadual em Campo Grande, ambas, inclusive, com os cursos de medicina.
Gabriel Novis Neves
03-07-2023
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