quinta-feira, 12 de junho de 2025

CONVERSAR COM A CIDADE


Um cuiabano, professor da nossa universidade, certa ocasião me chamou a atenção:

 

— Há necessidade de nossos dirigentes conversarem com a cidade.

 

Fez alusão ao distanciamento da nossa elite intelectual em relação aos problemas do cotidiano.

 

A universidade é um instrumento de valorização humana para todos os habitantes de uma cidade e de sua região. Daí a necessidade de dialogar com ela.

 

Não é um corpo estranho alienado de seu contexto.

 

Ambos — universidade e cidade — devem percorrer os mesmos caminhos. Partilhar das mesmas inquietações. Sonhar as mesmas ambições.

 

A cidade tem seu calendário próprio, feito de datas que a tornam desigual — dias festivos, dias santos, dias comuns.

 

Estamos em plena Semana Santa, tempo em que a vida da cidade, impulsionada pela fé religiosa, se transforma.

 

É tão bonito relembrar esses dias, que nos transportam a um passado cheio de histórias e tradições!

 

Trazemos para bem perto de nós os avós, os pais, os irmãos, os tios, a igrejinha da Matriz, o padre, e o belo ritual da Semana Santa.

 

A cidade santificada conversava com sua gente.

 

As procissões, as missas, os sermões, as rezas, o incenso, os sinos, o ato do lava-pés, a Via Sacra, a crucificação de Cristo, o velório, a ressureição.

 

Durante uma semana, a cidade e seus moradores se entristeciam — para no Domingo de Páscoa, se abraçarem de alegria.

 

Esses momentos da nossa história procuro nos dias atuais... e não os encontros. A cidade, hoje, é a de todos os dias.

 

Sinto saudades da minha infância, e da cidadezinha onde nasci.

 

Como era bom viver por aqui, naqueles tempos...!

 

Até a comida era diferente. E não faltava a canjica — tradição ainda mantida por poucos.

 

Hoje, a cidade permanece desligada durante a Semana Santa.

 

Será que essa descaracterização de um evento de tamanha religiosidade pode ser atribuída tão somente, à violência urbana?

 

A população embruteceu?

 

Ninguém mais conversa com a cidade?

 

A fé religiosa que trago da infância me deu saudades e forças para revisitar meu passado — nesta emblemática tarde de Quinta-Feira Santa.

 

Gabriel Novis Neves

17-04-2025




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