Quando deixei Cuiabá para estudar Medicina no Rio de Janeiro, ainda não havia completado dezoito anos. Minha irmã caçula, por sua vez acabara de fazer um ano de idade.
Já estudante de Medicina, vi nascer minha última irmã, que hoje tem setenta anos. Eu, noventa.
Cresci junto com os quatro primeiros filhos do casal Novis Neves.
Mas a vida tomou seu curso, e cada um de nós seguiu um caminho.
Retornei a Cuiabá após onze anos, já casado, e logo vieram os filhos em escadinha, conforme o planejamento da minha mulher.
Entre meus irmãos, tive mais contato com Pedro, com quem cheguei a morar no Rio, durante o período em que ele estudava.
Já quando Inon chegou para cursar a universidade, eu estava de partida regressando à minha cidade natal.
A Yara, dois anos mais nova que eu, terminou o ensino médio e ficou por aqui, aguardando o namorado concluir o curso de Medicina para se casar.
A reprodução lá em casa foi tão impressionante que, em fevereiro tenho dois irmãos nascidos com uma diferença de catorze dias — embora em anos distintos.
Já em março, dois outros compartilham a mesma data de nascimento, mas também em anos diferentes.
Janeiro (Aracy), fevereiro (Inon e Yara), março (Ylcléa e Olyntho), julho (eu e Ana), agosto (Tieta), setembro (Pedro) — entre 1935-1955, vinte anos de nascimentos sucessivos.
Mas o que me leva a escrever esta crônica não é apenas a matemática familiar.
É a constatação de que, apesar de sermos irmãos, não fui educado junto com os mais novos.
E agora, já velhos e desfalcados de dois, que habitam o plano espiritual, sinto falta disso.
Aquela intimidade que só as crianças compartilham, não vivi.
Ainda que todos tenhamos nos casados e morado na mesma cidade por muito tempo, o laço do convívio diário nunca se fortaleceu.
Curioso é que meus irmãos tinham mais intimidade com a minha mulher, que era estrangeira.
Contavam-lhe segredos, buscavam seu apoio. Ela sempre os acolheu.
Meu irmão Inon mora no Rio, e pouco contato tenho com sua família.
Já os que ficaram por aqui me visitam de vez em quando. Nessas ocasiões conto-lhes sobre nossa história.
Quando exercia minha profissão foram meus clientes. E, de uma forma ou de outra, procurei sempre ajudar a todos, sem exceção.
Minha mulher foi um polo agregador da família, em torno dela giravam os encontros, as confidências, os afetos.
Nos aniversários, no Natal, no Ano-Novo, o ponto de encontro era em nossa cassa.
Mas, apesar dos anos e dos reencontros, a intimidade verdadeira seguiu distante.
Envelhecemos, cada um em seu próprio universo.
Gabriel Novis Neves
15-02-2025
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.