Este início de ano tem sido generoso com as chuvas que caem sobre nossa cidade.
Águas que lavam, refrescam e alteram o ritmo urbano, impondo uma pausa forçada a quem se acostumou ao calor seco e ao asfalto fervente.
Aqui, onde o sol reina absoluto a maior parte do tempo, qualquer mudança climática provoca reações visíveis.
Com as chuvas, os hábitos se transformam, os passos se desaceleram.
As ruas, que sob o verão esturricante são dominadas pelo barulho e pela pressa, enchem-se de silêncios entrecortados pelo tamborilar da água nas telhas, no asfalto encharcado, nas folhas das mangueiras antigas, nos toldos das feiras, que resistem ao tempo.
As pessoas buscam abrigo apressadas, esgueirando-se sob marquises, reclusas em bares e lanchonetes de esquina, onde o café quente se torna aliado.
A cidade assume ares de feriado preguiçoso, um domingo prolongado em que muitos fogem para recantos mais acolhedores, distantes da urgência cotidiana.
Às margens dos rios, riachos e córregos, famílias estendem redes, pescam, assam carne.
Chegam no final do sábado, descansam no domingo e retornam à noite, carregando no rosto a serenidade dos que encontraram refúgio na simplicidade.
Ali, entre o cheiro da terra molhada e o rumor das águas, a chuva não é ameaça, mas convite à contemplação.
Mas nem tudo é paz.
Numa cidade de trezentos anos, nascida sem planejamento e expandida às pressas, a água encontra resistência.
Córregos transbordam, ruas se tornam rios, o trânsito vira um labirinto de desvios e congestionamentos.
Aeroportos fecham, famílias vigiam o nível da enxurrada. A cidade se encolhe, se esconde, aguardando que o céu, em sua sabedoria, decida quando devolver o azul.
Gabriel Novis Neves
02-02-2025
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