Entrei no grupo escolar completamente analfabeto.
Nunca havia pisado numa escola, tampouco conhecia a sala de aula, com suas carteiras de madeira para dois alunos, o quadro negro, o giz e o apagador.
Sobre a mesa da professora repousava um pedaço de madeira, ao lado do pote de água filtrada e da caneca de alumínio compartilhada por todos.
A sala tinha uma porta de entrada e duas enormes janelas para o jardim Ipiranga.
Os alunos, uniformizados, eram organizados em três fileiras de cinco carteiras, cada uma para dois estudantes.
Ainda me pergunto por que a professora Oló me colocou no primeiro grupo, e não no segundo ou terceiro.
Logo percebi a diferença: meu grupo escrevia o abecedário nos cadernos de caligrafia, enquanto os demais já liam as lições do primeiro livro escolar.
Muitos colegas tinham sido alfabetizados em casa.
Enquanto eu suava sobre as páginas do meu caderno de caligrafia, eles avançavam com cadernos comuns e já nos outros grupos meus colegas já escreviam em cadernos comuns e já liam o segundo livro do curso primário.
Só no segundo semestre a professora me autorizou a iniciar a leitura.
Ainda assim, terminei o ano sem conseguir ler o livro inteiro.
Mas aprendi algo curioso: o pedaço de madeira sobre a mesa da professora era o sinal de que o banheiro estava livre.
Preenchi inúmeros cadernos de caligrafia. Naquele tempo, ter letra bonita era motivo de orgulho — um verdadeiro cartão de visitas da pessoa.
Lutei muito para alcançar os melhores da turma, o que só consegui no terceiro ano do primário.
Cheguei a ter uma letra bonita, que o tempo foi apagando, mas que nunca se transformou na letra ilegível dos médicos, decifrada apenas pelos farmacêuticos.
Aos noventa anos, devo isso à caligrafia.
Hoje, as crianças já começam no maternal, jardim e pré-escola, escrevendo e lendo com naturalidade.
Tudo ficou mais fácil.
Mas sem o exercício da caligrafia as letras perderam a beleza.
Gabriel Novis Neves
05-09-2025
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.