segunda-feira, 1 de setembro de 2025

CONVERSAS DO PONTO DE ÔNIBUS


Lembro-me de duas linhas de ônibus da Cuiabá antiga.

 

Faziam ponto ao lado direito da Catedral.

 

Uma seguia para o Coxipó da Ponte e a outra, em frente ao Palácio da Instrução, descia para o Porto.

 

Eram viaturas pequenas, com bancos de madeira dispostos em paralelo e sem janelas.

 

As que iam para o Coxipó eram conhecidas como jardineiras — todas fechadas, com janelas e uma única porta.

 

Não me recordo se havia cobradores ou se o próprio motorista fazia essa tarefa.

 

Para o Coxipó as viagens eram poucas, recolhendo-se os carros ao anoitecer.

 

Já para o Porto, o movimento era maior, graças à presença da Agência Migueis.

 

Ainda assim, a espera por cada partida nunca demorava menos de uma hora.

 

Meu pai era frequentador assíduo da Agência, sempre atento à chegada das mercadorias destinadas ao bar.

 

A porta de entrada e saída desses produtos era o rio Cuiabá, com seus barcos carregados.

 

Como prêmio, às vezes ele me levava para passear até o Porto.

 

Os pontos de ônibus tornaram-se lugares de longas conversas.

 

Era ali que se colocava a vida em dia.

 

Tive colegas que moravam no Porto e vinham a pé para a escola.

 

Minha mãe também tinha amigas naquela região.

 

Aos domingos e feriados, íamos caminhando até suas casas, onde passávamos as tardes.

 

Serviam bolinhos e doces deliciosos, cujos sabores ainda hoje guardo na memória, a me dar água na boca.

 

Eu, menino atento, escutava as conversas dos adultos no ponto de ônibus.

 

Era um verdadeiro jornal falado das novidades da cidade.

 

Ali ficava sabendo quem viajou, quem chegou, quem casou, quem morreu, quem nasceu — e, claro, das fofocas impublicáveis.

 

Falava-se de política, mas, diante de um forasteiro, a conversa se fechava.

 

O Porto era considerado o segundo distrito de Cuiabá, e os casarões da rua 15 de Novembro abrigavam moradores chamados de nobres.

 

Com a inauguração da ponte Júlio Muller, em 1942, veio a invasão dos moradores do terceiro distrito — Várzea Grande.

 

E, então, o Porto passou a pertencer de fato à Cuiabá.

 

As conversas nos pontos de ônibus multiplicaram-se, assim como as fofocas.

 

Gabriel Novis Neves

27-08-2025








Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.