Hoje ao postar uma crônica percebi que ontem foi uma data histórica muito importante na minha vida.
Conclui o curso de Medicina em 15 de dezembro de 1960 na Faculdade Nacional de Medicina da Universidade do Brasil, com a cerimônia realizada no Teatro Municipal do Rio de Janeiro.
Na época havia sido aprovado em concurso para acadêmico de Medicina da Prefeitura do Rio de Janeiro.
Com a mudança da capital para Brasília, os antigos acadêmicos foram aproveitados como médicos concursados do Estado.
Permaneci no Hospital e Pronto-Socorro Municipal Souza Aguiar — o maior do Brasil e da América Latina.
Continuei na Equipe Cata Preta. Seu chefe era o doutor Otávio Barbosa e o vice Paulo Ferreira.
Nossa equipe contava com cirurgiões gerais, neurocirurgião, angiologista, ortopedista e traumatologista, otorrino, oftalmologista, radiologista, pediatra, clínicos gerais, ginecologistas, obstetras, especialistas em análises clínicas, intensivistas e anestesistas.
O diretor-geral do hospital era o médico Brito Cunha.
O horário do nosso plantão, era o seguinte: às terças-feiras, das 14h às 20 h; às quintas das 20h até às 8h da manhã seguinte; domingos alternados das 8h às 20h.
O dia 31 de março de 1964 caiu numa terça-feira —dia do meu plantão.
No vestiário, durante a troca da roupa pelo uniforme branco, pouco antes das 14 h um tumulto tomou conta do local.
Algo grave estava para acontecer. Os colegas que encerravam o plantão desejavam boa sorte aos que entravam.
Como de costume fomos até a cantina do hospital tomar o cafezinho.
De repente uma voz grave soou pelos alto-falantes convocando os médicos Augusto Paulino Neto e Gabriel Novis Neves a comparecerem com urgência ao gabinete do diretor Brito Cunha.
Este nos recebeu com uma metralhadora no peito, uma estação de rádio clandestina no gabinete, e foi direto ao ponto:
—Estamos montando um hospital de campanha dentro do Palácio Guanabara onde está o governador Carlos Lacerda. Vocês foram escolhidos por méritos pessoais.
Preparamos uma ambulância disfarçada da Cruz Vermelha Internacional. Vocês irão deitados para evitar detenções. No Palácio serão levados diretamente para prestar atendimento médico ao governador.
Lacerda nos recebeu cercado por duas metralhadoras.
Participei de um dos momentos mais delicados da história recente do Brasil.
Sou talvez o único sobrevivente desse episódio que a história jamais registrou.
Gabriel Novis Neves
01-04-2025
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Carlos Lacerda com a metralhadora sobre mesa |
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