quarta-feira, 5 de março de 2025

CINZAS E PROMESSAS


Após os excessos do Carnaval a cidade acorda em um silêncio melancólico.

 

Confetes esquecidos pelo vento, serpentinas enroscadas nos postes, uma nostalgia que paira no ar.

 

Mas e o amor?

 

Poderia ser a história de um casal que se conheceu entre marchinhas e confetes, e agora, na Quarta-feira de Cinzas, sentem o peso do fim da festa, mas também a esperança do que ficou.

 

O brilho do encontro resistiu à folia?

 

Ou tudo foi apenas um encanto efêmero, como o Carnaval que se desfaz com o tempo?

 

Talvez ele a encontre na missa, com um traço de cinzas na testa e um olhar que pede um novo começo.

 

Ou talvez ela deixe um bilhete na mesa do café, sugerindo que algumas histórias, ao contrário da folia, não precisam acabar.

 

A Quarta-feira de Cinzas pode ser um fim, mas também um recomeço.

 

Que cinzas são essas que ficam: as do arrependimento ou as de um amor que renasce mais forte?

 

Ele caminha devagar pela rua ainda salpicada de confetes, sentindo o peso do silêncio depois da música.

 

A cidade parece suspirar, exausta, mas ele sabe que não é apenas a festa que ficou para trás.

 

No café da esquina, o cheiro de pão quente e o tilintar das xícaras quebram a monotonia da manhã.

 

Ele pede um café forte e se senta à mesa onde estiveram juntos pela última vez.

 

A mesma mesa, mas agora sem risos, sem os dedos dela desenhando distraidamente traços invisíveis na madeira.

 

Olha ao redor, procurando sem querer. Será que ela virá? Será que o encanto sobreviveu à ressaca da realidade?

 

Na igreja, os fiéis entram e saem em silêncio.

 

No altar, a voz do padre fala sobre cinzas, penitência e renovação.

 

Entre os rostos dispersos, ele a vê.

 

O traço escuro em sua testa destaca a serenidade de seu olhar.

 

Quando ela percebe sua presença, hesita por um instante, depois sorri, discreta.

 

Ele se aproxima devagar, sem certezas, sem promessas.

 

Apenas um gesto simples, um aceno, um convite sem palavras.

 

Ela respira fundo, como quem hesita entre o passado e o futuro.

 

Então, pega um pequeno papel e desliza pela mesa antes de sair.

 

Ele o abre com dedos trêmulos.

 

“Algumas histórias não precisam acabar. ”

 

Lá fora, o vento ainda arrasta os últimos confetes, mas ele já não se importa.

 

Gabriel Novis Neves

02-03-2025




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