Um dos cenários das antigas casas cuiabanas, hoje desaparecido com a modernidade, era a presença da máquina de costura num canto da varanda.
Ali, minha mãe passava as tardes quentes costurando roupas, sonhos e lembranças, num vaivém de pedal que embalava a vida.
A criançada jogava botão no chão e, entre risos, admirava aquela cena inesquecível.
Mesmo quando estudei no Rio de Janeiro por longos anos, a imagem da minha mãe costurando na varanda da nossa casa nunca me deixou.
O som compassado das pedaladas completava o quadro de ternura e trabalho.
Mais tarde ela se dedicou ao crochê e ao tricô.
Suas mãos criavam presentes para a família numerosa que ajudou a construir.
Guardo com carinho especial seu último presente de aniversário: um casaco de tricô feito com lã branca, que me aqueceu em muitas madrugadas frias de plantão.
Minha mãe foi uma verdadeira poliartesã. Autodidata, tinha talento para transformar tudo com as mãos.
Órfã de mãe aos três anos, aprendeu cedo com a vida.
Não suportava depender de ninguém, nem mesmo dos filhos.
Viúva por vinte anos, preferiu morar sozinha em um apartamento alugado.
Só por muita insistência aceitava passar os finais de semana em minha casa.
No último ano de vida, contratou uma cuidadora para acompanhá-la à noite.
Ainda assim, preparava salgadinhos para receber quem fosse visitá-la.
Era sempre uma atração: alegre, sentada na cadeira de balanço da sala de visitas, com algo nas mãos — um livro, um tricô —, sempre produzindo.
Nunca admitiu passar procuração a ninguém.
Escolheu minha irmã Aracy para ser sua secretária e com ela ia ao INSS, ao banco e à farmácia.
Teve uma vida de sacrifícios, mas também de recompensas divinas.
Nos últimos anos acompanhava a missa pela televisão.
Partiu numa madrugada, serenamente, dormindo.
Seu último desejo foi simples e belo: jantar uma fatia de pizza.
Gabriel Novis Neves
08-10-2025
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.