segunda-feira, 13 de outubro de 2025

OS SINOS QUE JÁ NÃO DOBRAM


Nasci próximo da antiga Igreja Matriz na Praça da República.

 

Da minha casa ouvia o repicar do sino, chamando os fiéis para a missa e para a reza da noite.

 

Minha iniciação religiosa foi guiada pelas badaladas do sino.

 

Os grandes eventos católicos — Natal, Ano Novo, Semana Santa — eu acompanhava pelo som das torres.

 

Na rua de Baixo havia uma igreja menor, a do Senhor dos Passos, com poucos festejos, mas com o seu sino à disposição.

 

Mais acima ficava a igreja de São Benedito, esta sim, festeira, repleta de ricas tradições.

 

Mudei-me depois para a rua do Campo, vizinho à igreja da Boa Morte.  

 

Seu sino, instalado em um campanário baixo, dificultava certas solenidades, como os batizados.

 

No meu retorno à Cuiabá, morei entre a igreja da Boa Morte e a da Mãe dos Homens.

 

No Porto vivi entre a igreja de Nossa Senhora Auxiliadora e a de São Gonçalo.

 

Sempre tive identidade com os sinos das igrejas, e com eles guardei muitas histórias.

 

Hoje já não ouço os sinos tocarem.

 

O sino que emudeceu guarda, em seu silêncio, a memória de festas, celebrações e anúncios de outros tempos.

 

Foi o da Matriz que, em 1945, anunciou o fim da Segunda Guerra Mundial.

 

Esse silêncio que desce das torres das igrejas carrega boa parte da história de Cuiabá, esperando que pesquisadores a transformem em documentos.

 

Mas a cidade cresceu tanto que perdeu suas belezas originais, jogadas no lixo do passado.

 

A ausência dos sinos fez a cidade perder referências.

 

A alegria do seu badalar está agora guardada na cesta de coisas que não voltam mais.

 

A cidade, sem o som dos sinos, tornou-se apressada, sem tempo para apreciar a beleza de seus detalhes com a serenidade de outrora.

 

Gabriel Novis Neves

03-09-2025




















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