O relógio da praça de Cuiabá erguia-se entre as torres da Catedral Metropolitana, em plena Praça da República.
Seu compasso sonoro alcançava todo o Centro Histórico da cidadezinha em que nasci.
Na rua de Baixo, onde vivi até os meus dez anos, ouvia-se com clareza o marcar das horas.
O badalar lembrava compromissos, encontros e despedidas.
Com a demolição da Catedral, em 1968, a população se uniu para custear a compra de um novo relógio.
Desde então, adquiri o hábito de, ao passar pela Praça da República, erguer os olhos para ele.
Quando, por algum defeito, silenciava, a frustração era coletiva: perdíamos um de nossos referenciais mais fiéis.
O badalar do relógio da praça, compunha a paisagem sonora do Brasil colonial.
Toda cidadezinha possuía o seu.
No Brasil de antigamente era sempre assim: praças, relógios, igrejas com torres e sinos.
Ao redor deles, crescia a população.
O progresso, porém, expulsou os moradores das praças.
Hoje, quem ali permanece são personagens solitários: o velho que lê um jornal esquecido, o taxista que descansa, a senhora que passeia com o cachorrinho, o chapéu de pano abandonado no banco.
E tudo isso sem o som do relógio para marcar as horas e lembrar compromissos.
Na juventude, da pensão onde morava no Rio, ouvia o relógio do Largo do Machado.
Mais tarde, senti falta de um relógio com quatro faces na Praça em frente ao Restaurante Universitário, da Cidade Universitária de Cuiabá, no Coxipó da Ponte.
Com mais de meio século de existência, quantas histórias teria ele a nos contar? Quantas memórias adormecidas despertaria?
Ali, onde jovens, professores e alunos se encontravam, quantos compromissos nasceram à sua sombra e quantos terminaram em casamento!
Hoje vivemos sem a poesia dos sons do relógio da praça.
Gabriel Novis Neves
20-09-2025
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